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Betabloqueadores (BB) - Tratamento Farmacológico

O uso dos betabloqueadores no tratamento da Insuficiência cardíaca crônica (ICC) já foi proscrito, pois se acreditava que o seu efeito inotrópico negativo seria deletério para os pacientes com a doença. Entretanto, quando estudamos mais a fundo a fisiopatologia da insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida sintomática, observamos que existe uma grande ativação de mecanismos neuro-humorais, incluindo o Sistema Nervoso Simpático, determinando uma elevação sistêmica dos níveis séricos de noradrenalina e outros agentes vasoconstrictores. Dessa forma, o bloqueio dos receptores beta adrenérgicos ganhou espaço, reduzindo os efeitos deletérios da ativação simpática e proporcionando um aumento na sobrevida dos pacientes com ICC.

A ação dos betabloqueadores utilizados no tratamento da ICC é bastante ampla:

  • Aumento na densidade de receptores beta 1 dos cardiomiócitos, ajudando a restaurar a capacidade de resposta inotrópica e cronotrópica do miocárdio, melhorando assim a função contrátil;
  • Redução do nível circulante de vasoconstrictores, incluindo a noradrenalina, renina e endotelina, que atuam aumentando a pós-carga, contribuindo para a progressão da disfunção cardíaca;
  • Redução na expressão de genes que induzem a produção das citocinas inflamatórias, envolvidas no desenvolvimento da IC;
  • Redução no remodelamento do ventrículo esquerdo, diminuindo os volumes sistólico e diastólico final do VE;
  • Na cardiomiopatia isquêmica, podem melhorar a função em regiões de miocárdio hibernante, reduzindo o consumo de oxigênio e aumentando a perfusão diastólica;
  • Normalização na expressão de alguns genes do miocárdio;
  • Redução na frequência de extrassístoles ventriculares e na incidência de morte súbita cardíaca (MSC), especialmente após um infarto do miocárdio.

O conjunto de todas essas ações se reflete na prática clínica através de uma melhora na função sistólica após o uso desse medicamento, com aumento da fração de ejeção em torno de 5 a 10% e, além disso, redução dos sintomas.

Mas, embora existam três classes de betabloqueadores: Não seletivos (Primeira geração), Beta 1 Seletivos (Segunda Geração) e Betabloqueadores com efeito Vasodilatador (Terceira Geração), o benefício citado anteriormente no tratamento da ICC não é observado em todas elas. Atualmente são preconizados apenas alguns betabloqueadores de 2ª e de 3ª geração (Bisoprolol, Succinato de Metoprolol, Carvedilol e Nebivolol), pois, aparentemente, não existe um efeito de classe e estes foram os únicos que mostraram resultados positivos para o tratamento da ICC.

O primeiro grande estudo que mostrou redução da mortalidade com o uso desses fármacos no tratamento da ICC foi o US-Carvedilol Heart Failure Study Group Trial, publicado em 1996 no NEJM. Trata-se de um ensaio clínico randomizado, placebo controlado e duplo cego que avaliou os efeitos do carvedilol na taxa de sobrevida e hospitalização por causas cardiovasculares em 1094 pacientes com ICC sintomática (CF II e III - NYHA) e FE < 35% (média: 23%), em uso de IECA, vasodilatadores, diuréticos de alça e digital. O resultado foi um menor índice de mortalidade e de hospitalização no grupo carvedilol, com uma redução de risco relativo de morte atribuído ao carvedilol de 65%, o que levou à interrupção prematura do estudo.

Outros estudos de grande importância na consolidação do uso dos betabloqueadores no tratamento da Insuficiência cardíaca foram o CIBIS II, publicado no Lancet em Janeiro de 1999, que comparou Bisoprolol versus Placebo, comprovando redução de mortalidade e morte súbita no grupo do Bisoprolol; o MERIT-HF, publicado em Junho de 1999 no Lancet que mostrou também redução de mortalidade e morte súbita com o Succinato de Metoprolol, em relação ao grupo placebo; CAPRICORN e COPERNICUS, ambos publicados em Maio de 2001 no Lancet e no NEJM, comparando Carvedilol e Placebo em pacientes pós-IAM (com ou sem IC) e na ICC severa (FE < 25%), respectivamente, ambos comprovando menor risco de morte no grupo Carvedilol. E, por último, o SENIORS, publicado em 2005 no European Heart Journal, que comparou Nebivolol e Placebo em pacientes com ICC (FE ≤ 35%) e idade a partir de 70 anos, comprovando benefício com o uso do Nebivolol (redução de risco absoluto de mortalidade por todas as causas e hospitalização).

Em todos esses ensaios clínicos os pacientes incluídos eram portadores de ICC compensada e a terapia foi iniciada em doses baixas, sendo tituladas gradativamente, dobrando a dose a cada 7 a 10 dias, de modo a atingir a dose máxima em 30 dias. A importância disso é minimizar o efeito inotrópico negativo, oferecendo uma tolerância melhor por parte dos pacientes. Entretanto, atualmente já existem estudos que mostram boa tolerância e resultados semelhantes com a duplicação da dose a cada 2 a 3 dias, permitindo atingir a dose máxima mais rapidamente e com segurança.

Tabela 1 - Doses dos betabloqueadores na IC crônica
Betabloqueador Geração Dose Inicial Dose Final
Succinato de Metoprolol 12,5mg, 1X/dia 100 a 200mg, 1X/dia
Bisoprolol 1,25mg, 1X/dia 10mg, 1X/dia
Carvedilol 3,125mg, 2X/dia 25 a 50mg, 2X/dia
Nebivolol 1,25mg, 1X/dia 10mg, 1X/dia

Atualmente, as recomendações apresentadas na atualização da Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica, publicada em 2012 quanto ao uso de betabloqueadores para o tratamento da ICC sistólica são as seguintes:

Tabela 2 - Recomendações para Betabloqueadores na ICC Sistólica Incluindo Etiologia Chagásica
Classe de Recomendação Indicação Nível de Evidência
I Bisoprolol, Carvedilol e Succinato de Metoprolol para o tratamento da IC com disfunção sistólica A, B*
I Classe Funcional II-IV da NYHA com disfunção sistólica associado com IECA ou BRA A, B*
I Classe Funcional II-IV da NYHA com disfunção sistólica como monoterapia inicial B, C*
I Pacientes assintomáticos com disfunção sistólica após infarto agudo do miocárdio, c/ CMPD, CMPI, Miocardite, em associação com IECA ou BRA B, C**
IIb Nebivolol em pacientes com idade < 70 anos, e bisoprolol/carvedilol/succinato de metoprolol para idade > 70 anos, Classe Funcional II-IV da NYHA com disfunção sistólica associado com IECA ou BRA B, C*
III Propranolol e Atenolol para o tratamento da IC com disfunção sistólica C
IECA: inibidor da enzima de conversão da angiotensina; BRA: bloqueador do receptor da angiotensina; NYHA: New York Heart Association; CMPD: **Cardiomiopatia Dilatada; CMPI: **Cardiomiopatia Isquêmica; **Miocardite; *Doença de Chagas.

Outro aspecto importante a ser ressaltado é que os betabloqueadores não devem ser iniciados na vigência de uma descompensação, visto que existe um efeito depressor na função cardíaca logo no início da terapia e os benefícios são observados apenas com 2 a 3 meses de uso. E no caso de uma descompensação na vigência do uso de betabloqueador, deve-se tentar manter a dose utilizada e, nos casos mais graves, reduzi-la à metade. A suspensão dessa medicação é preconizada apenas na presença de sinais de baixo débito cardíaco.

O uso dos betabloqueadores na ICC está contraindicado nos seguintes casos: pacientes com bloqueios atrioventriculares avançados; portadores de doença arterial periférica grave e portadores de asma brônquica ou DPOC grave, em vigência de broncoespasmo.

Assim, excetuando-se as circunstâncias citadas acima, os betabloqueadores estão indicados para todos os pacientes portadores de Insuficiência cardíaca crônica com disfunção sistólica sintomática e também no pós-infarto.

Betabloqueadores (BB)

Referências Bibliográficas:

  1. 1. COLUCCI, Wilson S. Rationale for and clinical trials of beta blockers in heart failure due to systolic dysfunction. UpToDate. 2012. Disponível em: < http://www.uptodate.com >. Acesso em: 11/06/2013.
  2. 2. Bocchi EA, Marcondes-Braga FG, Bacal F, Ferraz AS, Albuquerque D, Rodrigues D, et al. Sociedade Brasileira de Cardiologia. Atualização da Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica - 2012. Arq Bras Cardiol 2012: 98(1 supl. 1): 1-33
  3. 3. ROSSI NETO, J.M.; SIMÕES, M.V. Insuficiência Cardíaca. Seção 9. In: SERRANO JR, C.V.; TIMERMAN, A.; STEFANINI, E. Tratado de Cardiologia, SOCESP. 2 ed. Barueri: Manole, 2009.
  4. 4. MARCONDES BRAGA, F.G.; BACAL, F. Insuficiência Cardíaca Crônica: Tratamento. In: NICOLAU, J.C. et al. Condutas práticas em Cardiologia. Barueri: Manole, 2010. p. 373-388.
  5. 5. McMurray, J.J.V. Systolic Heart Failure. The New England Journal of Medicine, 2010; 362 (3): 228-38.
  6. 6. Bristow, M.R. β-Adrenergic Receptor Blockade in Chronic Heart Failure. Circulation, 2000; 101 (5): 558-69.
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